A infância inteira ouvindo : “Hey, acorda!”; “Presta atenção!”; “Essa menina vive no mundo da lua…”
Os adultos nunca me compreenderam. Eu nunca estive “no mundo da lua”, eu sempre estive no meu mundo, naquele mundo que sonhei pra mim. Esse mundo era muito distante, em um lugar chamado futuro. E como ele parecia incrível!
Sempre fui sonhadora, passava horas do meu dia imaginando tudo aquilo que gostaria de conquistar. Tinha um caderno com calendários que iam até 2013 (detalhe: era 2003), com todos os meus planos, minhas economias, mensagens inspiradoras e colagens de coisas que eu gostaria de ter e fazer.
O tempo foi passando e as coisas não foram exatamente como o planejado. E eu que sempre fui controladora me senti um fracasso. Eram sonhos grandes demais para mim.
Aos poucos , aqueles velhos cadernos pararam de fazer sentido…
Chegou 2013 e as coisas tinham fugido totalmente do controle. Eu era uma adulta agora, mas adulta mesmo, de verdade. Eu tinha um emprego fixo, uma casa, um carro e um filho para sustentar. Por outro lado, tinha um monte de coisa pela metade: uma faculdade inconclusa, problemas no relacionamento… E, quando a gente cresce e percebe o tanto de dificuldades que vão surgindo, os sonhos vão se distanciando cada vez mais. O irônico que eu sempre pensei no futuro, e sempre quis conquistar muitas coisas da “vida adulta”, mas eu nunca tive vontade de crescer. Não à toa um dos meus desenhos favoritos sempre foi Peter Pan.
De repente, me dei conta que não conseguia mais decifrar os desenhos das nuvens, percebi que não conseguia mais lembrar dos meus sonhos. Eu fui me anulando, me depreciando. Eu mal me olhava no espelho e quando me deparava com minha imagem, ela estava distorcida. Aquela não era eu. E não era quem eu queria ser.
As pessoas destruíram os meus sonhos, acabaram com a minha ingenuidade, me fizeram perder a minha melhor qualidade: a de sempre ter fé e esperança.
Eu levei anos para criar um abrigo, para sentir-me segura. E eles vieram sem piedade alguma e destruíram tudo. E eu fiquei ao relento. Enfraqueci. Minha alma doía. Enquanto eles riam da minha cara.
E eu também tive minha parcela de culpa. Porque eu não estava atenta o suficiente. Eu permiti que eles se aproximassem pouco a pouco, que estudassem meu jeito, deixei brecha para descobrirem minhas fraquezas, enquanto eu tentava demonstrar quão forte eu era.
Mas um dia, depois de derramar incontáveis lágrimas. Eu decidi que era hora de reagir. Eu não podia deixar que eles me corrompessem. Eu não queria ser como os demais adultos. Eu queria ser uma adulta, que tivesse os olhos brilhantes como o de uma criança quando faz uma descoberta incrível em seu quintal.
Eu tinha que reagir e foi isso que eu fiz. Em vez de evitar e fugir dos meus problemas, eu os enfrentei. Encarei as pessoas que tinham me feito mal, frequentei lugares que me lembravam coisas ruins. Sofri com veemência, chorei, me destruí. E depois de cair a última lágrima de tudo que estava me incomodando, senti que havia crescido. E como dói crescer. Mas algo tinha mudado: agora eu me sentia pronta.
Então, a mudança começou a acontecer lá dentro e aos poucos passou a refletir também do lado de fora, foi um longo processo, porém vitorioso. Aos poucos pude ver a luz que havia dentro de mim reacender. Eu tinha muitos sonhos de antes, mas já não era mais a mesma. Descobri que eu posso crescer e continuar cultivando alguns sonhos e sentimentos de quando eu era pequena. É até bom, para deixar a vida mais leve.
E eu sei que lá nos meus sonhos fica a minha Terra do Nunca e lá eu posso ser criança quando eu quiser. É só você reparar nos meus olhos brilhantes, que verá que dentro dessa armadura de “gente grande” existe uma criança, que as vezes se permite rir para a lua e brinca tentando adivinhar os desenhos nas nuvens.